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2021
Pesquisador da UFGD descobre duas novas espécies de peixes na bacia do Rio Taquari, em Alcinópolis-MS
Fernando Cesar Paiva Dagosta e Mário de Pinna coletaram duas novas espécies de peixe no município de Alcinópolis (MS), em um local ermo do rio Taquarizinho, tributário do rio Taquari, onde nenhuma expedição de pesquisadores jamais havia atuado. Fernando é professor da Faculdade de Ciências Biológicas e Ambientais da Universidade Federal da Grande Dourados (FCBA/UFGD), e Mário é diretor do Museu de Zoologia da Universidade de São Paulo (USP). Juntos eles publicaram, em abril, um artigo na revista científica Papéis Avulsos de Zoologia, no qual descrevem as duas espécies de peixes novas para a Ciência.
Fruto do projeto "Distribuição, Biogeografia e Conservação dos Peixes do Cerrado", sediado na UFGD, financiado pelo CNPQ (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico) e realizado desde 2018, a descoberta está no artigo intitulado “Two new catfish species of typically Amazonian lineages in the Upper Rio Paraguay (Aspredinidae: Hoplomyzontinae and Trichomycteridae: Vandelliinae), with a biogeographic discussion”, que pode ser traduzido como: Duas novas espécies de bagres de linhagens tipicamente amazônicas no Alto Rio Paraguai (Aspredinidae: Hoplomyzontinae e Trichomycteridae: Vandelliinae), com uma discussão biogeográfica.O artigo chama a atenção, portanto, para o registro de peixes de linhagens tipicamente amazônicas em Mato Grosso do Sul, em uma região que faz parte da bacia do Rio Paraguai. Para os autores do artigo, essas espécies provavelmente chegaram ao Rio Taquari durante o processo de formação do Pantanal, em um evento geológico que resultou no afundamento da região. Por causa disso, os rios mudaram a direção de seus cursos, e rios que antes drenavam para a bacia Amazônica, começaram a drenar para a bacia do Rio Paraguai, carregando com eles alguns peixes amazônicos.
CONHEÇA AS NOVAS ESPÉCIES
As novas espécies de peixes são parentes dos bagres, conhecidas popularmente como Candiru e Banjo, tem pequeno porte, medindo no máximo três centímetros e receberam os nomes científicos de Paracanthopoma saci e Ernstichthys taquari, respectivamente. Paracanthopoma saci faz alusão à sigla do projeto que resultou na descoberta do primeiro exemplar da espécie (SACI – South American Characiform Inventory), dirigida pelo pesquisador Naercio Aquino Menezes, do Museu de Zoologia da USP, enquanto Ernstichthys taquari é uma referência ao Rio Taquari, onde foi encontrada.
Candiru que recebeu o nome científico de Paracanthopoma saci
Embora uma das espécies descritas seja um Candiru, cujos parentes amazônicos são temidos por invadir os orifícios genitais de banhistas, a espécie encontrada na bacia do Rio Taquari não oferece perigo, uma vez que, até hoje, não há registros de espécies desse gênero que tenham causado problemas aos humanos. Como todos os Candirus, é conhecido como um “peixe-vampiro”, pois se alimenta de sangue de outros peixes, por meio de ferimentos que faz nas brânquias dos seus hospedeiros. Os animais usados como base para a descrição foram capturados em bancos de areia no meio do rio, em locais sombreados pela mata ciliar, sem vegetação aquática, em profundidades que variam entre 30 e 150 centímetros. Parece ser uma espécie razoavelmente comum na área em que foi coletada, sendo a descrição da espécie feita com base em mais de uma dezena de animais.
Banjo que recebeu o nome científico de Ernstichthys taquari
Já o Banjo alimenta-se basicamente de larvas de pequenos insetos que encontra no fundo dos rios. Os exemplares que serviram de base para a descrição da nova espécie foram capturados em rio raso e de águas claras, com fluxo moderado de água, em substrato constituído por rocha e areia. A vegetação é formada por plantas aquáticas em alguns locais, com mata ciliar bem conservada, em ambiente sombreado. A espécie parece não ser abundante localmente, tendo em vista o pequeno número de indivíduos registrados até o momento nos estudos realizados.
CONHECER PARA PRESERVAR
A descoberta foi possível porque o projeto desenvolvido pelo professor Fernando Dagosta faz o levantamento dos peixes existentes no Cerrado, por meio da coleta em locais onde nunca foram feitas amostras antes. Com os dados obtidos é possível colaborar para o preenchimento do mapa do conhecimento sobre as espécies na região, informando quais delas estão presentes e quais ainda não foram catalogadas.
Os locais são escolhidos depois de um estudo prévio para verificar se alguma expedição já passou por lá e se a região é interessante do ponto de vista geológico, sendo mais pertinente, por exemplo, áreas de encontro entre bacias, pois cada bacia possui diferentes espécies.
“A gente precisa conhecer a biodiversidade para poder preservá-la. Qualquer espécie só tem direitos legais, direitos de ser protegida, se for reconhecida como espécie de fato. Por isso é importante coletar as espécies, identificar, descrever e indicar se ela precisa de atenção”, disse o professor da UFGD.
No artigo, o Candiru é classificado na categoria de ameaça como “dados insuficientes” e o Banjo como “quase ameaçado”. Por isso, a descoberta é relevante inclusive para mostrar a vulnerabilidade das espécies e a necessidade de preservação da bacia do Rio Taquari, que de acordo com a pesquisa, sofre com o desmatamento, o assoreamento e a contaminação por agrotóxicos que resultam de atividades como a pecuária e a monocultura de soja na região.
“É muito importante conhecer a nossa biodiversidade para que políticas públicas de conservação sejam aplicadas e possamos valorizar essas novas espécies como membros de Mato Grosso do Sul, espécies que só ocorrem aqui, diferentemente do jacaré e do tuiuiú que, apesar de serem nossos símbolos, também podem ser encontrados em outros estados”, alertou Fernando Dagosta.
Para outras informações, leia a íntegra do artigo científico em: https://www.revistas.usp.br/paz/article/view/183301
Jornalismo ACS/UFGD com informações de Documenta Pantanal