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2023
Em projeto de Iniciação Científica, professora e acadêmicas da UFGD transformam a aula de Química em uma viagem pela cultura afro-brasileira
Todos os dias, usamos sabonetes e sabões para retirar a gordura de louças, roupas e as sujeiras do nosso corpo. Mesmo sendo um produto cotidiano, nem todas pessoas sabem que para fazer um sabão ou sabonete os ingredientes principais são os óleos e gorduras. Os processos químicos que envolvem a produção de um sabão são mesmo muito curiosos. E ainda mais intrigante é pensar: como é que nossos ancestrais tiveram a ideia de misturar outros produtos à gordura para produzir o sabão?
No Brasil, há centenas de anos o sabão de cinzas, também chamado sabão da costa, é produzido de forma artesanal ou importado de países da costa africana. Este sabonete de cor negra é feito a partir de cinzas e usado até hoje, especialmente por participantes das religiões afro-brasileiras. No contexto religioso, o sabão de cinzas é usado não somente para limpar o corpo e ambientes físicos, mas também para limpar energias espirituais.
O projeto de Iniciação Científica "A inserção da História e Cultura Afro-Brasileira no Ensino de Química por intermédio do lúdico" busca, dentre seus objetivos, estudar a Lei 10.639/03 em relação às práticas pedagógicas do Ensino de Química. O projeto ainda visa apresentar maneiras de contextualizar esses conteúdos na Educação Básica, inserindo essa temática nas escolas por meio do lúdico. Uma das sequências didáticas elaboradas no âmbito do projeto trata da origem e produção do sabão de cinzas, em uma série de cinco aulas que unem conhecimentos de história, ciências sociais e química. Ao mesmo tempo que as aulas ensinam sobre conceitos como ligações químicas, polaridade, tensão superficial, o projeto também atende à lei 10.639/2003, que torna obrigatório o ensino de História e Cultura africana e afro-brasileira no ensino fundamental e médio. A iniciativa é da professora Elaine da Silva Ramos, do curso de Química da UFGD.
Essas aulas estão sendo aplicadas junto às turmas de 2° e 3° anos do Ensino Médio na Escola Estadual Floriano Viegas Machado, na unidade curricular "Artesanal ou industrial? Produção sustentável de sabonetes e outros produtos”. Quem está acompanhando essas atividades é a Nicole Pereira Martins de Lima, estudante do 7º semestre do curso de Química, que é integrante do projeto. Outra estudante da UFGD, Ana Walkilaine Barbosa do Nascimento da Silva, participou da aula de contextualização histórica e religiosa do uso do sabão de cinzas.
Conforme Nicole, o projeto demonstra aos estudantes do ensino médio como os conhecimentos de disciplinas diferentes se complementam, para que possamos compreender situações cotidianas. Além de ser uma forma de trabalhar conteúdos interdisciplinares, o projeto ainda busca estimular a lógica e a metodologia científica entre os jovens, trabalhando com mapas conceituais, modelos representacionais e outras formas lúdicas de organizar as informações que são coletadas por meio da pesquisa e da observação.
Livia Ribeiro Salomão Lopes, aluna da escola Floriano Viegas Machado está bastante empolgada com as aulas. “É uma maneira diferente de ensinar, porque a gente consegue fixar o conteúdo. Na hora da prova ou qualquer outra situação em que a gente precisar acessar essas informações, a gente vai lembrar melhor do conteúdo que estudamos”, argumenta a estudante. Para Riberto Nunes Peres, professor de Química da escola Viegas, os estudantes estão dando retorno positivo. “Eles estão vendo conteúdos de Química do 2º e 3º anos de ensino médio, de um modo aprofundado, que eles não vêm em uma aula de Química normal. Esse aprofundamento é muito relevante”, avalia o professor.
COMO O SABÃO LIMPA?
E se você teve curiosidade para entender como o sabão promove a limpeza, será necessário resgatar algumas informações das aulas de Química do Ensino Médio. Primeiramente, é necessário lembrar dos estudos da tabela periódica (aquela tabela com todos elementos químicos já conhecidos: o hidrogênio, oxigênio, enxofre, por exemplo). Os átomos de cada elemento químico têm uma quantidade de elétrons, prótons e nêutrons. Os elétrons têm carga negativa e ficam “girando” em torno do núcleo do átomo (onde ficam os prótons e os nêutrons). Por ficarem ali, “dançando” na eletrosfera, acontece de os elétrons de um átomo resolverem “dançar” na eletrosfera de outros átomos, e assim surgem as ligações químicas. Enquanto alguns elementos químicos têm mais elétrons disponíveis para fazer essa conexão com diferentes elementos, outros elementos têm elétrons “faltando” e acabam “puxando” elétrons vizinhos (esse assunto é abordado quando estudamos as ligações químicas, “camada de valência” e, depois, a “geometria molecular”).
Depois que aprendemos como é que os átomos se ligam, nós estudamos sobre a energia resultante das ligações químicas. A grosso modo, em algumas ligações químicas essa “dança” dos elétrons resulta em uma carga negativa ou positiva (molécula polar), em outras ligações químicas essa carga é nula (molécula apolar). Lembrou dessa parte das aulas?
A água é uma molécula polar. Já as gorduras são moléculas que, em geral, são moléculas apolares. Por isso, água e óleo não se misturam. Dessa forma, não adianta passar água em uma louça engordurada, pois a molécula de água não “gruda” na gordura. Os sabões e detergentes são formados por longas moléculas que têm uma parte apolar e uma extremidade polar. A parte polar consegue “grudar” nas moléculas de água, e a parte apolar “gruda” nas moléculas de gordura. Assim, o sabão consegue fazer com que a água escorra ralo abaixo, levando junto a gordura.
Jornalismo ACS/UFGD
Estudantes fazendo um dos modelos representacionais das ligações químicas.
O professor Riberto e a bolsista Nicole tirando dúvidas dos alunos em sala de aula.