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Novembro
19
2015

Autodeclaração e cotas foram debatidas no encerramento do II Seminário Diálogos Interculturais

  Atualizada: 19/11/2015
A programação de encerramento do II Seminário Regional “Diálogos Interculturais, Currículo e Educação de Fronteira Étnico-Racial” e da VI Semana da Consciência Negra contou com as palestras sobre “A classificação de raça e cor no Brasil”, ministrada pelo Prof. Dr. Jefferson Mariano, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), e sobre “A Implementação da Lei das Cotas e os Critérios de Autodeclaração”, ministrada pelo Prof. Dr. Reinaldo dos Santos, da Faculdade de Educação da UFGD.

As apresentações foram complementares. A primeira palestra trouxe muitos dados para contextualizar a temática e a segunda tratou de situações práticas e teve a UFGD entre os exemplos.

Logo no início de sua fala, Jefferson Mariano apresentou um quadro (foto 1) para ilustrar as mudanças na classificação do Censo ao longo do tempo. Antes essa classificação era racial, como branco, preto, mestiço e caboclo e depois, em 1960, a classificação foi por cor, o que transformou as categorias de mestiço em pardo e de caboclo em amarelo. Já em 1981, mais uma classificação foi inserida, a de indígena, de modo que o último Censo, de 2010, classificou os fenótipos em branco, preto, pardo, amarelo e indígena.

Por conta dessas mudanças, Jefferson Mariano explicou que uma linha de pesquisadores é contrária a classificação da população negra como a soma de pretos e pardos, afirmando que é difícil ter certeza de que os pardos são negros. No entanto, para o palestrante, utilizar a classificação “negro” ainda é uma discussão política bastante complicada, porque existe uma tentativa de evitar o enfrentamento do racismo e a implementação de políticas afirmativas no Brasil.

Com o objetivo de demonstrar que o racismo é realidade no país, Jefferson Mariano apresentou diversos dados e pesquisas que apontam que por causa do preconceito e da discriminação, a cor/raça da pessoa tem influência no acesso dela ao mercado de trabalho, à justiça, à educação, à saúde e ao convívio social. Para exemplificar essa desigualdade, comparou algumas ocupações, entre elas a de dirigente de empresa, em que 74% são brancos e 26% são negros, e a de ajudante de obras, em que 70,9% são negros e 29% são brancos.

Também trouxe dados sobre a população economicamente ativa (PEA) do ano de 2010 (Foto 2), em que os negros eram maior parte entre os desempregados e os trabalhadores sem carteira assinada, enquanto que os brancos eram a maior parte entre as empregados com nível superior (72,6%).

Contra o argumento de que o número de pessoas se declarando pretas e pardas aumentou só por causa do interesse em participar das recentes políticas afirmativas, Jefferson Mariano mostrou a pequena variação entre brancos, pretos, pardos, amarelos e indígenas nos censos de 1991, 2000 e 2010 (Foto 3).

Para os interessados em mudanças no Censo do IBGE, como a criação da categoria “negro”, por exemplo, uma oportunidade de colaborar para esse processo é participar da conferência dos usuários, que seria realizada em 2015, mas que não ocorreu este ano por conta dos cortes no orçamento. Quando ela ocorrer, a sociedade pode se manifestar sobre os critérios que deseja.

AUTODECLARAÇÃO
Como a autodeclaração é um critério muito questionado e que gera dúvidas, Jefferson Mariano explicou que ela é usada pelo IBGE com base na Declaração de Durban, documento da ONU (Organização das Nações Unidas) produzido na  III Conferência Mundial contra o Racismo, a Discriminação Racial, a Xenofobia e as Formas Conexas de Intolerância, que ocorreu em 2001 em Durban, na África do Sul. A autodeclaração é um fundamento do IBGE, mas as comissões de concursos, por exemplo, podem acrescentar outros critérios de identificação.

Na UFGD, um concurso docente foi denunciado no DPF/RJ em 2015 questionando que o candidato aprovado em cota não era pardo/preto. Como a autodeclaração é válida até ser contestada, a UFGD teve que realizar procedimentos para verificar a validade daquele caso de autodeclaração.

Sobre isso, o prof. Dr. Reinaldo dos Santos, docente da Faculdade de Educação e membro da comissão de especialistas formada para fazer essa validação, explicou os procedimentos criados pela comissão da UFGD.

Para saber se o candidato possuía correspondência fenotípica ou se a declaração era falsa e elaborar um parecer conclusivo e fundamentado, os procedimentos foram: Análise da declaração, de documentos pessoais e de fotografias anteriores; Entrevista presencial com observação; Coleta de imagens fotográficas; Deliberação de alter/heteroatribuição; E laudo fenotópico.

De modo que as dimensões para validação ou não da autodeclaração foram: Confirmação, histórico e fundamentação da autodeclaração; Alter/heteroatribuição ou não da condição de “pardo” ao avaliado, pelos membros da comissão; E caracterização ou não como “pardo” a partir de aspectos fenotípicos tecnicamente sistematizados. Além da cor da pele, foram observadas a textura do cabelo, o formato do nariz e lábios e a cor dos olhos. No final, a autodeclaração do candidato foi considerada verdadeira.

Para Reinaldo dos Santos, é necessário avançar na efetividade da lei sobre cotas raciais no serviço público, a Lei nº 12.990/2014, já que ela não possui decreto regulamentador. Além disso, a punição para quem usa de má fé na autodeclaração de um concurso, que hoje é apenas a eliminação do concurso, deveria ser mais rígida, já que em outros aspectos da seleção, o candidato responde criminalmente por fraude.  

O maior rigor deveria ainda ser acompanhado pela prevenção, com a verificação das autodeclarações durante a seleção e não apenas a partir da denúncia sobre o resultado. “É preciso que mecanismos sejam criados e divulgados, para que essa luta de séculos, pelo direito às cotas, não fique esvaziada”, afirmou.

As palestras dessa noite foram mediadas pelo Me. Jonas de Paula Oliveira (FAED/UFGD – NEAB/GEPRAFE).

Os eventos começaram em 16 de novembro, foram realizados pelo Núcleo de Estudos Afro-Brasileiros (NEAB) da UFGD e o tema do II Seminário Regional “Diálogos Interculturais, Currículo e Educação de Fronteira Étnico-Racial” foi “Por uma pedagogia crítica e decolonial”.

INFORMAÇÕES
https://dialogosinterculturais.wordpress.com
http://portal.ufgd.edu.br/setor/neab